Carta ao Presidente.
Amigos Fanáticos. Prometi na última coluna publicar a carta que enviei ao Presidente da Federação. Vou aproveitar a onda caridosa para reconhecimento de títulos que ronda nos bastidores das instituições mandatárias do futebol brasileiro e carioca para bater na mesma tecla sobre o Título de 1919 conquistado pelo Bonsucesso na Liga Suburbana de Futebol. É puramente legítima a reivindicação que faço, pois a própria Federação reconhece um título do Botafogo em 1912, título este conquistado pela liga AFRJ (Associação de Football do Rio de Janeiro) fundada pelo próprio Botafogo, depois que o clube se desentendeu com a LMSA (Liga Metropolitana de Sports Athléticos). A liga do Botafogo foi apelidada de “Liga Barbante” pela imprensa da época devido a pouca expressividade dos demais participantes.
Sobre a carta, enviei ao Presidente em junho de 2010 e nunca recebi uma resposta. Nem mesmo um “não rotundo” (Leonel Brizola usou este termo no debate presidencial da TV Bandeirantes em 1989) para essa pretensão.
Fiz com orgulho a minha parte de defender nosso título. E sempre lembrarei desse grande feito do nosso Bonsuça, o mais tradicional suburbano do Brasil.
A carta consta de texto e citação de autores para comprovação da idéia do parágrafo. Retirei a citação de alguns autores para redução da carta na coluna. Quem interessar pela carta completa, é só pedir que a envio. Boa leitura e abração a todos.
►A Carta:
Rio de Janeiro, 31 de maio de 2010.
Ilmº. Sr. Presidente da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro
Rubens Lopes da Costa Filho
Senhor Presidente
Em 1919 o Bonsucesso Futebol Clube, tradicional clube suburbano da cidade do Rio de Janeiro, participou da 1ª divisão da Liga Suburbana de Futebol, sagrando-se campeão. No quadro de campeões cariocas da distinta FERJ não consta o nome do Bonsucesso como campeão. Na minha modesta opinião, considero tal procedimento uma injustiça, em razão do contexto histórico discriminatório na criação e organização de campeonatos no território do então Distrito Federal. Desde o 1º campeonato considerado oficial pela FERJ que todos somos cientes das questões preconceituosas que envolviam a formação das primeiras ligas de futebol, além das altas taxas cobradas aos clubes participantes. Vários autores demonstram este tipo de comportamento vindo da elite carioca organizadora dos tais campeonatos oficiais:
“Eram muitos os jogadores desses times mais humildes. Na busca da reconstituição desse futebol suburbano, o jornal O Imparcial traz uma cobertura muito boa dos vários campeonatos que ocorriam no Rio de Janeiro. O jornal A Gazeta Suburbana, apesar dos poucos números ainda existentes, também dá uma boa descrição do futebol suburbano carioca.
Além dos valores mais baixos cobrados pelos clubes suburbanos, estas instituições adotavam em seus estatutos meios mais democráticos de admissão de sócios. Eram proibidas quaisquer distinções de cor, nacionalidade, opção política ou religiosa. A comparação com os estatutos da LMDT, pode demonstrar o caráter mais democrático das ligas suburbanas.”.
MALAIA, João Manuel C. “O futebol na cidade do Rio de Janeiro: microcosmo dos
mecanismos de poder e exclusão no processo de urbanização das cidades brasileiras (1901-1933)”
A única alternativa para disputar um campeonato seria participar de ligas não elitistas, como a Liga Suburbana e outras mais. A LSF não era uma sub-liga. Era constituída por divisões, 1ª e 2ª, além dos quadros de 1º, 2º e 3º times. Apesar do pouco prestígio das ligas consideradas não oficiais, o espaço geográfico de competição era bem superior às ligas elitistas. Por favor, observe os quadros abaixo dos participantes dos campeonatos da liga de 1919: * Ver na edição de 07/05/10
Apesar de toda a real consideração com os tradicionais clubes de maior investimento, não entendo o porquê da FERJ, ciente de todos esses fatos imorais de preconceito, o não reconhecimento de títulos cariocas por parte de outras ligas, como a LSF, que também tinham seus destaques na imprensa da época e cedia bons jogadores para a “elite do futebol carioca”:
“No campeonato de 1919, o Vasco busca reforços na Liga Suburbana - a mais humilde das ligas, dos negros e mestiços - e a equipe se fortalece ainda mais.“
SempreVasco.com
Se não fossem destacadas, não seria possível hoje o conhecimento de suas atuações sobre o espaço geográfico do então Distrito Federal. O termo “carioca” está sendo mal empregado quando se refere os campeonatos dirigidos pelos clubes elitistas. O “carioca” vai muito além do centro e zona sul da cidade:
“Foi impossível conter o “foot-ball”, que ia se tornando “pébol” na boca dos operários e moradores de bairros afastados da zona sul carioca. Em 1919, já haviam sido criadas três ligas para abrigar tantos boleiros: a Metropolitana, a Suburbana e a Associação Atlética Suburbana. Juntas, elas tinham em seus quadros 56 agremiações e 1.192 jogadores. Além disso, cerca de mais 300 clubes apareciam nos noticiários dos jornais naquele ano.”.
LEONARDO AFFONSO DE MIRANDA PEREIRA. Footballmania - Uma História Social do Futebol no Rio de Janeiro, 1902-1938.
Outra questão a ser abordada é o reconhecimento da própria FERJ de campeonatos considerados “piratas”, caso da “liga barbante” (AFRJ) de 1912 fundada pelo Botafogo e dos campeonatos da LCF (
Dessa forma abre-se um precedente. A Federação tem que “abraçar” todos seus filiados de forma igualitária. Ao reconhecer títulos inexpressivos e “piratas” de alguns clubes, então cabe também o reconhecimento do título do Bonsucesso Futebol Clube pela LSF, também por se tratar de um dos fundadores da LFRJ, liga embrionária da FERJ: * Ver site da FERJ, no setor história.
O curioso é que o clube Paysandu tem como reconhecido um título carioca, apesar de nem participar da fundação da LFRJ. Aliás, senhor Presidente, não quero que interprete as citações dessa carta como instrumentos de desprezo junto às conquistas de outros clubes nas ligas AFRJ e LCF. Todos têm seus méritos e valores históricos na construção do futebol carioca e brasileiro.
Senhor Presidente. O reconhecimento do título de campeão carioca pela LSF não passa apenas como um mero ato administrativo, mas sim como uma demonstração da entidade maior de nosso futebol fluminense de gratidão pelos bons serviços prestados do Bonsucesso Futebol Clube ao esporte carioca, desde a sua fundação até a consagração de craques do passado que defenderam a camisa rubro anil e brilharam nos gramados nacionais. Também será um ato de repudiar os atos preconceituosos contra os jogadores e os clubes de menor investimento.
Acredito que seria um grande gesto histórico de sua digna administração na FERJ a incorporação de todos os títulos conquistados na LSF ou em outra liga suburbana carioca pelos fundadores da FERJ.
Sem mais, agradeço a sua digna atenção.
Cordialmente,
George Joaquim Ferreira Machado
Conselheiro Benemérito do Bonsucesso Futebol Clube
